Num dia de Novembro de 2003, no TAGV, tive a feliz oportunidade de assistir a um concerto de Carl Hancock Rux. Ouvia, pela primeira vez, aquela voz incrivelmente quente, cuja veracidade se espalhou por todo o teatro, levando-me desde a lágrima até, na última canção, à dança.
Foi assim que iniciei o final do ano a ouvir Rux Revue e Apothecary Rx – dois álbuns que me surpreenderam, pois mostraram ser ainda melhores do que o esperado. São o exemplo da harmonia criada entre o rústico e o urbano – tão sincera quanto ao vivo, o que nem sempre acontece.
A spoken-word de Carl Hancock Rux, revela-se serena e sábia; está presente e impõe a mensagem sem dar espaço à violência – porque a sensatez das palavras é a adequada e os "pontos", "vírgulas", "reticências" e "parágrafos" são revelados por uma voz grave que sabe o que faz. A presença de vozes femininas, cuja força é notoriamente benvida por Carl Hancock Rux, acrescenta cores e sabores a cada canção. Se os sons são, por si só, um pilar que segura as palavras, aquelas vozes elevam-nas a um patamar onde os detalhes se compõem de forma excepcional.
Este poeta – porque ele é, antes de mais, alguém que usa a ilusão das palavras de uma forma tão verdadeira quanto a realidade que transmite – dá a conhecer também o seu berço: é Harlem que se ouve – o de ontem, o de hoje e, sem que a mão se chegue ao fogo, o de amanhã.
Ao ouvir Carl Hancock Rux, ouvem-se pedaços de uma sociedade actual e é assim que, ainda que do outro lado do oceano, é tão fácil vivenciá-la. No entanto, acredito ainda que se ouvem as suas raízes – a angústia em Wasted Seed provoca provoca um suave lamento que funde, pelo menos, blues, jazz e hip hop. Por outro lado, em No Black Male Show é o uso voluntariamente excessivo de hip hop e seus estereótipos.
Mas a verdade é que, Carl Hancock Rux é tudo menos um estereótipo e as suas obras, quer escritas quer sonorizadas, são prova disso.
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